Pesquisa aponta que as pessoas buscam ajuda profissional para cuidar da saúde mental, mas encontram motivação no trabalho que realizam
* Alexandre Cézar de Oliveira Melo – Administrador e Professor. Supervisor de comunicação e marketing do CIEE/MG. Membro do Comitê Executivo do Movimento Minas 2032.
Cuidar da saúde mental e do bem-estar emocional tem se tornado uma prioridade cada vez maior entre os profissionais do Terceiro Setor. Cerca de 55% deles expressa algum nível de preocupação neste sentido, pois tais cuidados refletem diretamente na satisfação e na motivação para o trabalho.
A compreensão de que a saúde mental e o bem-estar são fundamentais para o desenvolvimento das capacidades individuais e coletivas das Organizações da Sociedade Civil (OSCs, conhecidas também como ONGs), foi o ponto de partida para que a Phomenta realizasse em 2023 a pesquisa “Saúde Mental e Bem-Estar no Terceiro Setor”. Os dados trazem informações sobre os desafios, as pressões e as vivências dos profissionais que atuam em ONGs, buscando assim contribuir com estratégias eficazes de apoio, fortalecimento emocional e promoção de segurança psicológica nos ambientes de trabalho.
A pesquisa foi realizada nos meses de agosto e setembro de 2023 com a participação de 842 respondentes, provenientes de 214 cidades distribuídas por todos os 26 estados brasileiros, além do Distrito Federal.
Os participantes responderam a um questionário com 45 questões, estruturado em quatro seções denominadas (i) Informações Pessoais, (ii) Informações Organizacionais, (iii) Percepção de Bem-Estar e (iv) Percepção de Saúde Mental no Terceiro Setor.
Aos serem indagados sobre a preocupação com a saúde mental e o bem-estar, 38% dos respondentes classificaram-nas como “regulares” e 17% como “ruins”. Juntos, esses dados revelam que mais da metade (55%) dos respondentes expressa algum nível de preocupação ou insatisfação com sua saúde mental e bem-estar. Este é um alerta urgente para intervenções intervenções, suporte e recursos que devem ser direcionados para lidar com a saúde mental no Terceiro Setor.
Outro dado interessante envolve as mulheres que formam 65% da força de trabalho no Terceiro Setor. São elas que expressam as maiores preocupações relacionadas à sua saúde mental e bem-estar em comparação com seus colegas homens. De cada 10 mulheres pesquisadas, pelo menos 6 demonstram algum nível de preocupação com a sua saúde mental, ou seja, 60% delas apresentam condições de alerta neste sentido. No caso dos homens, menos da metade (45%) expressou percepções semelhantes.
As respostas foram analisadas também sob a perspectiva da idade dos respondentes. Os jovens, de 18 a 24 anos e de 25 a 34 anos, destacaram-se por expressar mais preocupações, com uma proporção maior de respostas classificando sua saúde mental como “regular” ou “ruim” (69% e 70%, respectivamente). A pesquisa ressalta que “quanto mais jovem, menor o índice de saúde mental”.
Em um artigo para o jornal O Estado de São Paulo, o Ph. D. Joel Rennó Jr., professor do Departamento de Psiquiatria da FMUSP, destaca que a pandemia e o período pós-pandemia “têm se destacado por problemas de saúde mental entre os jovens. Alguns fatores de resiliência como os vínculos sociais, escola ou universidade e prática de atividades físicas foram deixados de lado durante o período de confinamento. No mundo todo, jovens se queixam de solidão duas vezes mais do que em outros grupos etários. Automutilação e ideações suicidas também aumentaram entre os grupos jovens”.
A remuneração foi apontada como um fator de descontentamento. Os dados da pesquisa apontaram para uma preocupação crescente entre aqueles que não se consideram bem remunerados (63%) que classificaram sua saúde mental e bem-estar como “regulares” ou “ruins”, devido à tensão que a falta de remuneração adequada pode exercer sobre o bem-estar mental. As percepções das mulheres em relação à remuneração, torna-se ainda mais evidente. Entre 61% delas, há uma preocupação com salários, pois não se sentem adequadamente remuneradas por seu trabalho. Esta proporção é ligeiramente mais alta do que a observada entre os homens, onde 60% têm a mesma percepção.
Entre os líderes, 77% das pessoas responsáveis por liderar outras pessoas e que responderam à pesquisa, afirmam estar motivados com seu trabalho e 74% estão satisfeitos. No entanto, apesar do resultado positivo e maior que os resultados de pessoas não-líderes, que apresentaram 58% de motivação, apenas 40% consideram sua remuneração adequada e somente 15% consideram sua saúde mental e bem-estar muito bons e excelentes.
Ausência de reconhecimento, falta de equilíbrio entre a vida pessoal e o trabalho, bem como a limitação de recursos adequados/necessários para a realização da atividade laboral, são pontos de insatisfação e de preocupação entre as pessoas que participaram da pesquisa. O excesso de demandas e de tarefas é o principal estressor, segundo 64% dos respondentes, resultado este que destaca uma realidade na qual os trabalhadores muitas vezes se encontram sobrecarregados, enfrentando múltiplas tarefas e responsabilidades que vão além de suas capacidades e horas de trabalho.
Quando perguntados sobre quais os sintomas são mais percebidos diante dos fatores de estresse encontrados no trabalho, a “ansiedade” emergiu como o mais frequentemente citado, com 77% das menções. Em estreita relação com a ansiedade, a "exaustão física" foi o segundo sintoma mais reportado, com 64% das menções. Esta exaustão, muitas vezes, pode ser uma consequência direta da ansiedade crônica, onde o corpo e a mente são constantemente submetidos a níveis elevados de estresse. Assim como, efeitos causados por um modelo de gestão extenuante e não sustentável, em que faltam recursos, equilíbrio entre vida pessoal e profissional e excesso de tarefas, por exemplo.
Infelizmente, mais de 70% dos respondentes afirmaram não perceber ações intencionais de suas organizações para promover o bem-estar dos colaboradores. Além de sugerir que muitas organizações podem simplesmente não ter tais iniciativas em prática, pode ser também que, as ações existentes podem não estar sendo percebidas como intencionais ou eficazes. De acordo com a pesquisa da Phomenta, aqueles que afirmaram ter ações intencionais, mencionaram uma variedade de práticas e iniciativas que suas organizações adotaram para promover a saúde mental e o bem-estar dos colaboradores. Entre as práticas mais citadas estão:
- Atendimento Psicológico e terapêutico;
- Espaços de diálogo;
- Formações e palestras;
- Flexibilidade no trabalho;
- Momentos de confraternização e de lazer; e
- Benefícios adicionais (além dos tradicionais).
A mudança de percepção das ONGs e a promoção de ações em prol do bem-estar e da saúde mental dos colaboradores, será fundamental para a promoção do acesso a práticas de saúde mental. Devem visar a valorização e o reconhecimento do papel dessas pessoas e do valor do trabalho delas dentro das organizações.
A pesquisa completa está disponível em https://www.phomenta.com.br/pesquisa-saude-mental-e-bem-estar com a conclusão de que “o fortalecimento emocional das pessoas que se dedicam ao trabalho no Terceiro Setor e a necessidade de rever práticas de trabalho são fatores primordiais para um impacto social verdadeiramente positivo e coerente na sociedade que queremos. Isso só será alcançado ao colocarmos, de maneira intencional, as pessoas no centro do cuidado”.